sexta-feira, 30 de novembro de 2012

TEMOR À MÍDIA


Dois fatos ocorridos na semana – a princípio sem relação entre si – chamam a atenção para mostrar como países geograficamente próximos podem ter diferenças abissais quando se trata de temas imprescindíveis para a consolidação do Estado de cidadania. 
No dia 27, o relator da CPI do Cachoeira, deputado Odair Cunha (PT-MG) retirou do processo o pedido de indiciamento de cinco jornalistas – entre eles, Policarpo Júnior, redator-chefe da revista Veja – e a sugestão para que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, fosse investigado pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Desculpas protocolares à parte, Cunha cedeu a interesses corporativos de aliados (leia-se Sarney entre outros) e não quis “comprar briga” com o Grupo Abril. O que virá em contrapartida ainda não se sabe.
Enquanto isso, a Argentina, também comandada por uma mulher, Cristina Kirchner, encaminha para aprovação projeto de lei que prevê um início de regulamentação da mídia local. No mesmo dia 27, a justiça daquele país rejeitou pedido cautelar impetrado pelo Grupo Clarín. Pelo projeto, as licenças de concessão para funcionamento de TV devem ser distribuídas igualitariamente entre emissoras comerciais, estatais e entidades da sociedade civil. Além disso, as transmissões comerciais poderão ter alcance de até 35% da população – o Grupo Clarín, atualmente, detém cerca de 80% de toda a mídia portenha (algo como se a Editora Abril se unisse com a Globo e Folha para formar um único monopólio).      
No Brasil, apesar de provas, testemunhas e conversas telefônicas que envolvem o redator da Veja diretamente com o esquema de Carlinhos Cachoeira, o Congresso teme em convocar essa pessoa para depor; na Argentina, quebra-se um dos maiores e mais perigosos monopólios de comunicação do planeta.
Os exemplos não se restringem à Argentina. Em agosto, o governo do Equador anunciou a suspensão da publicidade oficial nos veículos monopolizados. “Por que temos de dar informação aos meios que nada mais querem do que encher os bolsos de dinheiro? Não vamos beneficiar empresas corruptas que não pagam impostos”, justificou o presidente Rafael Correa.
No Brasil, emissoras de TV são concessões públicas, não cumprem o que determina a lei, mas nenhum governo teve força ou disposição política de enfrentar esses monopólios. 
Em toda América Latina, governos sociais avançam na regulamentação midiática (Venezuela em 2000, Argentina em 2009, Bolívia em 2011). O Brasil, protagonista de tantas transformações no continente, infelizmente caminha na contramão; sequer o Conselho de Jornalismo (aos moldes da OAB, Creci, Conselho de Medicina) saiu do papel. É preciso ter coragem e um grande projeto político para enfrentar a mídia comercial; a sociedade avança com seus próprios instrumentos e uso da internet e redes sociais, mas o governo continua e refém da mídia golpista. 

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