terça-feira, 11 de dezembro de 2007

A firma. Ou o Estado de Banana


Vale a pena ler o texto a seguir até o fim pelas lembranças que traz sobre o clã dos Garibaldi, incluindo o senador Garibaldi Alves, que nesta quarta estará sendo elevado à categoria de presidente da Casa.

O texto, datado de outubro de 2000, é do Paulo Augusto, colei do Observatório da Imprensa. Vale pelas informações e pela forma como o autor conduz o texto.

(imagem... não confunda, esse é o Garibaldo, não o Garibaldi)


Paulo Augusto (*)
O indiozinho Janduí faz que não entende, mas fica só na moita. Ele lê jornal, vê TV, navega na internet e gosta de acompanhar, principalmente, as vicissitudes do poder dos brancos, sem meter sua colher de pau. Mesmo não compreendendo nada, faz como o matuto: quer apenas entender. E acha que entendeu, agora, por que o ex-ministro Aluízio Alves, em vez de massacrar Wilma de Faria, que o atacou sem dó nem piedade quando adversária, presenteou-a, há pouco, por sair da aliança com os Alves com um terceiro mandato na Prefeitura, dando-lhe o status de "liderança política no estado". O velho Cigano não brinca em serviço, e o índio Janduí acha que sabe por quê.
Janduí lembra que, candidata ao governo do estado em 1994, pela coligação Frente Popular pela Cidadania, Wilma de Faria enfrentou Garibaldi Alves Filho, Lavoisier Maia e Fernando Mineiro. Nos embates contra os adversários, Wilma centrou seu fogo nos Alves, a quem devotava especial ódio, segundo deixava transparecer. Para a edição do domingo de 7/8/94 do jornal O Poti, Wilma concedeu uma entrevista essencialmente rancorosa e venenosa, onde desancava a família que hoje é "dona do Estado". O jornal estampava, na 3ª página, a manchete: "Wilma acusa Alves de dominar o RN". Ali, Wilma denunciava estar então em curso "um projeto de dominação do Rio Grande do Norte pela família Alves", chefiado pelo então ministro da Integração Regional Aluízio Alves, e castigava os "sete Alves" candidatos que, utilizando sete empresas de comunicação, pretendiam perpetuar a dominação da família sobre o estado, fato que se consumou.
Eram os sete sinistros personagens, segundo a atual prefeita: "Garibaldi Filho, sobrinho e candidato ao governo, através do qual Aluízio quer governar; Henrique Alves e Ana Catarina, filhos e candidatos por legendas diferentes à Câmara dos Deputados; Carlos Eduardo Alves, sobrinho e candidato a deputado estadual; José Dias, genro e candidato a deputado; Fernando Freire, sogro do sobrinho de Aluízio; e Ismael Wanderley, ex-genro de Aluízio Alves e suplente do candidato Francisco Urbano, que disputa uma vaga no Senado."
Mimo e poder em excesso
As sete empresas, hoje, o Estado sabe quais são. Wilma as nomeava uma a uma na matéria, e já então integravam o Sistema Cabugi de Comunicação: "Todos eles foram adquiridos ou montados pelos Alves depois que entraram na política. Em vez de empresários que montam negócios para dar empregos, os Alves se tornaram donos de um sistema de comunicação cujo único objetivo é contribuir para a dominação do estado". E declinava os veículos: TV Cabugi, Rádios Cabugi AM e FM, Rádio Difusora de Mossoró, Rádio Cabugi Seridó, de Jardim do Seridó, e FM Líder (atual 104) de Parnamirim.
"Nos veículos – explicitava a prefeita –, fazem um noticiário jornalístico tendencioso que beneficia apenas as candidaturas dos familiares e dos aliados políticos. E nós vamos denunciar isto com provas ao TRE." No entanto, pondera o índio Janduí, usou de sabedoria o velho Cigano com a víbora de 1994. Em 2/10/00, um dia após as eleições, relata o Jornal de Hoje: "O presidente do PMDB, Aluízio Alves, atribui a vitória da prefeita Wilma de Faria ao trabalho administrativo e à aliança feita com o governador Garibaldi Filho." E a mimoseia: "Wilma constitui-se numa nova liderança no quadro político do estado."
Janduí identifica, no gesto, a segunda das 48 Leis do Poder, de Robert Greene e Joost Elffers: "Não confie demais nos amigos, aprenda a usar os inimigos." Ou seja, segundo os autores: "Cautela com os amigos – eles o trairão mais rapidamente, pois são mais rapidamente levados à inveja. Eles também se tornam mimados e tirânicos. Mas contrate um ex-inimigo e ele lhe será mais fiel do que um amigo, porque tem mais a provar. De fato, você tem mais a temer por parte dos amigos do que dos inimigos. Se você não tem inimigos, descubra um jeito de tê-los." E Janduí ainda vê aí a mão de Diane de Poitiers (1499-1566), amante de Henrique II, da França, que dizia: "Para um bom inimigo, escolha um amigo. Ele sabe onde atacar." Além da lição de Tácito (c. 55-120 d. C): "Os homens apressam-se mais a retribuir um dano do que um benefício, porque a gratidão é um peso e a vingança, um prazer".
Há prova maior de enfado, fruto de mimo e poder em excesso, verdadeira soberba exposta no açougue da mídia do que a trazida a público sem pudor pelo deputado Carlos Eduardo Alves? Sobrinho do Cigano Aluízio, primo do governador Garibaldi Alves, filho do senador Agnelo Alves, prefeito eleito de Parnamirim, ex-marido da mais votada vereadora deste pleito, na mais cara campanha da história do estado, Fernanda Freire, filha do vice- governador Fernando Freire, o rapaz precisaria aprender que não é pela lâmina que se segura a espada, mas pelo punho, para poder se defender? Como o Cigano também sabe que se lucra mais com seus inimigos do que o tolo com seus amigos, como ensina Baltasar Gracián (1601-1658).
O causo: deputado estadual Carlos Eduardo Alves cedera sua vaga na Assembléia a um suplente, enquanto ocupou a Secretaria de Trabalho, Justiça e Cidadania. Os trabalhos ali empreendidos serviram de discurso de palanque na campanha da qual saiu vitorioso, e o alçou a vice-prefeito, na chapa de Wilma de Faria. Na semana passada, ameaçava renunciar ao mandato de vice-prefeito de Natal e permanecer no plenário da Assembléia Legislativa, provocando um terremoto no edifício de promessas a suplentes e aliados costurado por Garibaldi.
O índiozinho Janduí nem pestaneja. Sabe, com Maquiavel, que "o homem que tenta ser bom o tempo todo está fadado à ruína entre inúmeros outros que não são bons". Sabe também que a seita do reverendo Moon acaba de comprar uma cidade inteira, onde moram 6 mil habitantes, numa das regiões mais pobres e inóspitas do Paraguai, pagando 17,5 milhões de dólares por cerca de 350 mil hectares de terra da cidade de Puerto Casado. Por que uma família, qual empresa bem azeitada e servida, não transformaria um estado, farto de riquezas naturais numa região bronca e anêmica no interior do Nordeste, numa firma particular?
(*) Jornalista, e-mail

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